Você acha que enganou a morte? Foi a morte que enganou você.
Agora sim, bem vindos a Night City
Cyberpunk 2077 foi, sem sombra de dúvidas, um game que gerou imensas expectativas. Foi também um jogo que talvez tenha sido a maior decepção da geração anterior, justamente pelo hype gerado, e pelo ótimo game de foi The Witcher 3: Wild Hunt, da mesma produtora. Você pode pensar que classificar Cyberpunk assim, como uma imensa, enorme, gigantesca e titânica decepção pode ser algo muito duro, mas é fácil esquecer o quão quebrado o jogo de RPG muito, muito, muito, mas muito aguardado estava no seu lançamento em dezembro de 2020. Absolutamente cheio por bugs que destruíram a experiência do jogador e prejudicado por um problema de travamento consistente. A versão da última geração de consoles do Cyberpunk 2077 foi nada menos que um desastre - um jogo claramente inacabado, lançado as pressas pra agradar gente rica que bancou o jogo e queria seu investimento dando lucro. E rápido.
Aqui estamos nós, quase 2 anos depois, e para ser justo com a CD Projekt Red, temos que revisitar essa decepção em formato de jogo. A desenvolvedora passou 14 meses melhorando e adicionando conteúdo, patches e fixes ao Cyberpunk 2077 - até atrasando a edição PS5 do jogo para além de 2021 - data previamente anunciada - para que pudesse garantir sua qualidade geral. Obviamente, é decepcionante que tenha demorado tanto para chegar a este ponto, e por respeito aos gamers deveria ter sido lançado com a qualidade de hoje, ainda mais com toda a experiência prévia adquirida no jogo do bruxão mais amado dos videogames, mas estamos felizes em informar que Cyberpunk 2077 finalmente parece um jogo finalizado no PS5.
Passando pelo nosso tempo com 2077 no PS5, os piores problemas técnicos que arruinaram o título no PS4 foram resolvidos - ou seja, as falhas e os bugs que quebravam o jogo e a experiência. A coisa toda parece e funciona muito melhor do que no console anterior da Sony e, embora isso certamente não nos faça esquecer o estado inicial do jogo no PS4, ver o jogo neste estágio no qual se encontra agora deixa óbvio o fato de que 2077 simplesmente não estava pronto para lançamento. No mínimo, este é o Cyberpunk que os fãs do Playstation deveriam ter recebido em 2020.
Esta cidade não te dá escolha. Ou você queima vivo ou então nunca existiu.
No PS4, havia um potencial real enterrado sob todo o lixo, falhas, bugs e crashes – o esqueleto de um RPG de futuro sombrio e cativante, uma distopia envolvente a ser explorada. Com a versão de PS5, esse esqueleto foi exumado, ou melhor, ressuscitado por um necromante habilidoso que conseguiu até colocar carne e músculos naqueles ossos, não não... foi levantado e usado como base pra um ciborgue... Er, o que estamos tentando dizer é que tudo que o Cyberpunk é se torna muito mais fácil de apreciar quando não está travando a cada 45 minutos, e suas missões não estão apresentando problemas. Agora Cyberpunk é Cyberpunk.
Este é o RPG de mundo aberto que a CDPR vinha prometendo desde sua revelação completa em 2018? Perfeitinho e sem falhas? Jamais errado e coberto de razão? Não – e provavelmente nunca será. Mas quando o jogo realmente funciona e você está percorrendo as ruas lotadas de neon de Night City, ouvindo rádios a caminho de sua próxima missão, se torna fácil se perder em Cyberpunk 2077. É um ambiente brilhantemente desenvolvido, com uma atmosfera envolvente e um constante clima de aventura.
Muito da força de 2077 está em seu cenário. Night City é basicamente o inferno na terra - uma colmeia perigosamente superlotada de escória e vilania, onde uma bala perdida pode acabar com sua (provavelmente miserável) vida a qualquer momento. O jogo faz um trabalho fantástico de fazer a cidade parecer intimidadora no começo – como se a morte estivesse sempre esperando na próxima esquina – mas isso permite uma curva de progressão de personagem recompensadora. Com bastantes contratos entregues em seu currículo e acesso a todos os tipos de armas e habilidades, você passa de presa a predador nesta selva urbana, numa progressão agradável e que pode ser percebida.
Acorda Samurai, temos uma cidade pra queimar
Há uma fantasia de poder definida no coração de Cyberpunk. Seu personagem principal, personalizável, V, pode ser construído de várias maneiras diferentes. Você pode se especializar em armas, furtividade, hacking, katanas – e dominar habilidades específicas significa que você pode começar a esmurrar um vilão, ou seus capangas, só por olharem para você de forma estranha. Toda vez que você sobe de nível, parece que está dando outro passo significativo para se tornar uma lenda viva de Night City - e o sistema de vantagens reformulado do jogo (a partir da atualização 1.5) ajuda muito nesse sentido, oferecendo um melhor equilíbrio de habilidades e buffs de estatísticas.
A jogabilidade do Cyberpunk – especificamente o combate – começa a florescer à medida que você joga, e quanto mais tempo, melhor. Inicialmente, a mira instável de V com revólveres pode ser fonte de alguma frustração, mas continue usando sua arma e sua proficiência aumentará - e essa mesma regra se aplica a todas as habilidades do jogo. Não é um sistema de progressão único, mas é muito agradável e, novamente, dá a real sensação que você está ficando cada vez mais poderoso.
Também ajuda que os inimigos pareçam ser mais inteligentes, a IA de personagens não jogáveis foi visivelmente melhorada com a atualização 1.5. Os oponentes buscam se proteger atrás de coberturas e objetos mais frequentemente, trazendo um toque de estratégia muito bem vindo para a maioria dos encontros.
Eu amo esta cidade. A cidade das oportunidades infinitas. As lendas nascem aqui.
Mas é Night City que mais se beneficia de ter NPCs atualizados com inteligência básica de mundo aberto. Os cidadãos realmente fogem do perigo - alguns até ficam e lutam! – e você pode causar o caos absoluto atirando em uma rua movimentada. A metrópole não parece mais uma ilusão sem vida no PS5. NPCs e tráfego surgem a uma taxa muito maior e reagem um ao outro. Coisas básicas, sim, mas são esses pequenos detalhes que fazem os mundos abertos parecerem vivos – como se eles continuassem a existir mesmo se você não estivesse por perto.
A existência de V é muito importante para a história de Cyberpunk, no entanto. Um assalto que dá terrivelmente errado deixa o mercenário espertinho com um chip experimental alojado em sua cabeça. Esse chip abriga o fantasma digital de Johnny Silverhand - um revolucionário de 50 anos atrás que enfrentou uma das corporações de tecnologia mais tirânicas do mundo.
Muitos dos melhores momentos do Cyberpunk fazem parte de sua narrativa principal – e você pode dizer que foi para lá que uma boa parte do orçamento foi (e não apenas porque Keanu Reeves interpreta Silverhand). Suas missões principais são facilmente algumas das mais variadas e polidas do jogo, com ótimo ritmo, cenários de combate cuidadosamente projetados e um excelente elenco de personagens.
Em 2077, o que torna alguém um criminoso? Ser pego
A trama principal é um passeio emocionante, mesmo que seja um pouco difícil de seguir em alguns pontos. A escrita de Cyberpunk é geralmente afiada e envolvente, mas é fortemente dependente de termos e frases deste universo, e pode levar algum tempo pro jogador se acostumar a isso. Embora a incorporação de palavras específicas em quase todas as conversas adicione ainda mais peso à já incrível construção de mundo do jogo, às vezes pode parecer que você precisa de um glossário ou um novo dicionário pra saber ao certo o que tá acontecendo.
Felizmente, você sempre pode descansar das missões centrais da história e percorrer Night City como achar melhor. Missões opcionais compensam grande parte do tempo de execução do Cyberpunk, e jogar elas é, como dito, uma ótima experiência. Juntamente com missões secundárias, que dão bastante gordura ao jogo e prolongam sua vida útil, as quais têm suas próprias histórias tipicamente insanas para contar, fora daquele padrão onde você apenas caça criminosos e recupera certos itens para clientes que acaba se tornando automático e maçante em alguns jogos.
Muitos desses objetivos melhoram ainda mais o sabor do jogo. Alguns dos conteúdos mais instigantes de Cyberpunk estão escondidos por trás desses contratos secundários aparentemente simples e, ao se envolver com eles, você acaba tendo uma noção melhor do que é Night City. E, claro, isso ainda ajuda a obter itens e XP.
Ah, e o ritmo do mundo aberto também foi bastante aprimorado (obrigado novamente, atualização 1.5). Na versão original, os NPCs que entregam as missões - os fixers - acabavam atrapalhando mais do que ajudando, deixando seu mapa muitas vezes lotado de ícones. Esse não é mais o caso no PS5. A mudança faz com que a vida mercenária em Night City pareça muito mais orgânica e gerenciável.
Continuando, devemos pelo menos mencionar a funcionalidade do DualSense no jogo, que na verdade é surpreendentemente boa. O feedback tátil é bem utilizado, fornecendo ruídos distintos, esteja você dirigindo por uma estrada esburacada ou espalhando a palavra do Sr. chumbinho com sua metralhadora favorita. Da mesma forma, os gatilhos adaptativos do controle agem para simular frenagens e aceleração quando você está atrás do volante - embora o nível de resistência possa parecer um pouco rígido demais às vezes.
Em fim, Cyberpunk é uma experiência muito melhor no PS5, basicamente em todos os aspectos - mas se você se sentiu mal no PS4, além dos problemas técnicos e do mundo aberto que parecia de papelão, vale lembrar que este ainda é o mesmo jogo. A história principal ainda é um pouco atrofiada e lenta as vezes, apesar de ser boa, e as opções de role-playing à sua disposição podem parecer decepcionantemente limitadas. Ainda é melhor encarar o Cyberpunk 2077 como um Deus Ex: Mankind Divided de mundo aberto, ou um Far Cry futurista (e, para ser justo, muito mais profundo, e bem menos repetitivo - sim Ubisoft, a gente percebe que vocês repetem a mesma fórmula e conjuntos de missões desde FC3). Com a expectativa na medida, Night City é um destino e tanto.
Conclusão
Cyberpunk 2077 no PS5 é o jogo que os fãs do Playstation deveriam ter jogado em seu lançamento em 2020. Embora ainda fique aquém das imensas expectativas que cercaram seu lançamento, tudo o que Cyberpunk apresenta é muito mais fácil de desfrutar quando o jogo não é prejudicado por problemas técnicos irritantemente constantes. A história principal é emocionante, o combate é rápido e desafiador na medida certa pro storytelling e Night City é mundo aberto incrível e bem feito. E a melhor parte é que o CD Projekt Red finalmente tem uma base estável para construir mais e mais, entregando conteúdos extras, e não mais correções. Demorou 14 meses para o game chegar até aqui, mas o futuro do Cyberpunk 2077 realmente pode ser muito promissor.